Fernando Morais (Planeta, 2008)
Quando questionado sobre o massacre da gramática e da ortografia em seus primeiros livros, Paulo Coelho dizia que "Deus estava nos erros". Ao escrever a biografia do mago, Fernando Morais parece ter incorporado essa máxima: dá raiva encontrar, na primeira edição da obra, erros tão básicos de informação e revisão - Lily Marinho, viúva de Roberto Marinho, aparece como Lilly; na mesma data (e no mesmo capítulo), PC ora tem 34, ora 35 anos; o avô materno é tratado como avô paterno, "cigarro aceso" virou "cigarro acesso" e tigelinha, barbaridade!, virou tijelinha. (Tem mais, é que estou com preguiça de procurar.)
Erros acontecem com mais freqüência do que gostaríamos. Mas, infelizmente, esse não é o principal defeito do livro. Dá pra chamar de picaretagem - uma biografia que se pretende reveladora de grandes segredos não conta quase nada que já não foi dito sobre PC. Ah, tem lá as internações em clínicas psiquiátricas na adolescência, o moleque que ele atropelou e depois fugiu, a covardia diante da namorada presa pela ditadura. Interessante. Mas nada disso ajuda a entender o fenômeno em que PC se tornou no mundo todo com livros mal escritos, histórias piegas e doses cavalares de auto-ajuda.
As duas etapas da vida de Paulo Coelho que mais interessam a quem tenta entender seu sucesso dizem respeito, primeiro, à fase em que se dedicou ao ocultismo, magia negra e satanismo, fez um pacto (e depois desfez) com o demônio, diz ter estado na presença do coisa-ruim e de repente abandonou tudo. Só que Fernando Morais mal trata disso. Fala da conversão do escritor à ordem O.T.O., liderada por uma figura esquisita e adoradora do demônio, e de resto passa por cima: não há menção a rituais, cultos, benefícios ou qualquer outra coisa importante dessa época. Segundo, a reconversão ao catolicismo, depois de uma visão do Mestre (que ficaria famoso nas páginas de Diário de um Mago), seu mentor na R.A.M, uma ordem católica. Religião e magia? É isso o que o Mestre, Jean, combina. Como assim? Que raio de ordem é essa? Como surgiu? Por que PC foi escolhido para fazer parte dela? São perguntas básicas, que não merecem resposta ou consideração do biógrafo.
Por fim, e não menos absurdas, são a falta de bibliografia (não houve pesquisa para escrever o livro? Ele não leu artigos de jornal, outros livros sobre o mago, nada nada nada?) e de notas que digam como, quando e quem Fernando Morais entrevistou. As declarações de PC, por exemplo. Não dá pra saber se foram feitas ao autor ou se foram tiradas de alguma reportagem sobre ele - só dá pra ter certeza de que é ele quando Morais transcreve trechos de seus diários. Há opinião de gente que não se sabe quando, ou se, falou com Morais. Há lembranças de ex-namoradas que tanto podem ter conversado com o biógrafo ou saído da memória de Paulo Coelho. Fora a falta de explicação para tanta coisa de menor importância (PC plagiou Carlos Heitor Cony na juventude e depois o veterano escritor foi um de seus maiores cabos eleitorais para a Academia Brasileira de Letras; mas como Cony recebeu o plágio? No idea).
O caso é que Fernando Morais, assim como Paulo Coelho, diz em 600 páginas exatamente o que as pessoas querem ouvir, sem se aprofundar nos fatos realmente misteriosos - e interessantes - da vida do escritor. Pelo olhar de Fernando Morais, a mirabolante história de vida de Paulo Coelho não passa de outro mirabolante romance que poderia ter sido escrito pelo próprio Coelho.
PS. Cony manifestou-se a respeito do plágio de Paulo Coelho num artigo publicado na Folha de S. Paulo em 19/06/08.
5 comentários:
Olá, não li a biografia de Paulo Coelho. Não lie não lerei. Sem entrar no mérito de temas m´sticos, pois existem obras belíssias nesta área, somente quem realmente entende destes temas poderia escrever aquilo que realmente importa na vida de Paulo Coelho, aquilo que deu sentido a sua vida; ora, sobre sua busca espiritual afinal, foi ela que o levou a chegar onde está!. Assim, não me surpreende que Morais não tenha muito falado sobre esse tema, mas o que ele sabe sobre ordens, temas mágicos, espiritualidade e outros mais? como atesta você em seu belo artigo, nada! se dejeamos ler sobre um tema convencional, procuramos quialquer autor menos Paulo Coelho. O que o deixou conhecido, foram temas que nada tem de comum. Assim, ler sobre a Academia de Letras(que horror), como as pessoas gostam dele, sua fama e outras bobagens, nada esclarece as pessoas que buscam nestes temas respostas as suas próprioas buscas. Cada macacaco no seu galo. Que os literatas escreveram literatura, os ecologistas sobre meio ambiente, os poetas sobre poesia, e os magos sobre magia. E o que é que o Paulo Coelho acha que esta fazendo nos ultimos livros escrevendo sobre coisas que nada tem a ver com ele? Como autor convencional ele jamais será aceito, se perder seu público na área m´stica, vai escrever para quem?
Luiz Gonzalez
Olá, Luiz. Acredito que o papel de um bom biógrafo é inteirar-se dos assuntos que afetam a vida de seu biografado. Ainda acho que Fernando Morais pisou na bola ao deixar de lado aspectos importantes na vida de Paulo Coelho. E será que o PC deixou mesmo de lado o tema "místico"? Um abraço, Isabel
Meus sinceros parabéns por ter tido a paciência de ler esta "obra" e ainda gastar um tempo para comentá-la.
As únicas coisas que conheço de PC são suas músicas com Raulzito. E é muito provável que serão as únicas mesmo. Não pretendo ler nada escrito por ele ou sobre ele.
É que eu gosto mais de falar mal com conhecimento de causa... ;-)
Geralmente faço isso, mas nesse caso abro mão disso.
Não gosto e pronto!
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