sábado, 28 de março de 2009

A viagem do elefante

A viagem do elefante
José Saramago (Companhia das Letras, 2008)

Nunca imaginei que pudesse me divertir tanto com um livro de Saramago - preconceito, admito, porque depois de O evangelho segundo Jesus Cristo eu não tive coragem de ler mais nada dele. Adorei O evangelho..., mas a ideia de que todo o Saramago teria parágrafos enormes e pontuação não-convencional me desanimou. Pois, pra minha sorte, descobri em A viagem do elefante um escritor que eu não imaginava existir: irônico e, às vezes, até engraçado. (Thanks, Ana!)

Pouco dá vontade de escrever sobre a viagem do elefante Salomão e do cornaca Subhro desde Belém até Viena - melhor mesmo é ler para saber o motivo que levou Dom João III, rei de Portugal, a despachar o bicho ao primo Maximiliano, de Áustria; o trajeto do elefante primeiro até Valladolid, na Espanha; uma quase guerra provocada pelos soldados que escoltavam Salomão; a despedida dos portugueses; o milagre em Pádua e o impagável trecho em que um padre resolve "benzer" o animal. E não foi só a história que agradou. Gosto muito quando o narrador põe-se a comentar fatos sabendo de antemão o que vai acontecer na trama; gosto desse papel de cronista que, ao falar de uma viagem feita no século 16, usa exemplos atuais para comentar a jornada.

Anotei diversas passagens do livro. Uma das que mais me agradam e que deveriam ter servido de lição, tivesse eu lido antes:

"Não que fosse essa a intenção nossa, mas, já sabemos que, nestas coisas da escrita, não é raro que uma palavra puxe por outra só pelo bem que soam juntas, assim muitas vezes se sacrificando o respeito à leviandade, a ética à estética, se cabem num discurso como este tão solenes conceitos, e ainda por cima sem proveito para ninguém. Por essas e por outras é que, quase sem darmos por isso, vamos arranjando tantos inimigos na vida."

2 comentários:

Alexandre Kovacs disse...

Viva José Sarmago! Livro delicioso sem dúvida.

Ricardo N.C. disse...

Recentemente tivemos uma discussão em nossa instituição, onde foi desdenhado o comentário de uma pessoa que ficou ofendida com as palavras que foram escolhidas para a redação de uma carta.
Tempos depois, durante a leitura do livro em questão, me deparei com mais uma reflexão genial do Saramago, e resolvi encaminhar um e-mail para as pessoas envolvidas. Desta forma, acredito que, se nós não lemos antes, outros podão ser poupados de perdas grandes por coisas pequenas.