Maria de Lourdes Ramos Krieger (Brasiliense, 1979)
Quando o supermercado Zaffari, do Rio Grande do Sul, abriu uma loja aqui em São Paulo, achei que depois de mais de vinte anos eu ia realizar meu sonho de comer cuca de maçã, que existe desde que li Recordações de um agente secreto. Esqueci o nome do narrador, um garoto de Brusque, SC, que não pára de falar das cucas feitas pela mãe: de banana, de maçã, de tudo o que é fruta, cobertas com farofa doce. Corri pro Zaffari, mas nenhuma das cucas que eles vendem se parece com as do livro. Comprei uma de banana, até gostosa, caramelada, mas nada a ver com o que minha imaginação pedia. É arriscado, isso, querer comer alguma coisa que está na nossa cabeça só por causa de algo lido há tanto tempo. Às vezes, compensa: hoje, no Santa Luzia, encontrei uma cuca fofinha, com recheio úmido de maçã e coberta com farofa. Foi dar a primeira mordida e voltar à história do roubo dos selos olho-de-boi.
Nosso herói infanto-juvenil - João o quê? - mora na pequena Brusque e começa a perceber que tem alguma coisa estranha na cidade quando dá um esbarrão num tipo mal-encarado; um burro-estúpido. Uns dias depois, mistério: desaparecem os selos olho-de-boi de um filatelista conhecido. João (mas João o quê?) começa a se interessar pelo assunto, dá uma de detetive, descobre os bandidos. Mesmo sem o livro aqui ao meu lado, começo a me lembrar de vários detalhes interessantes da história: um brinco de flor, um par de abotoaduras, a brincadeira de contar os carros pela janela, o outro-eu, as exposições "científicas" que o pai freqüentava com os filhos. Uau. A cuca de maçã do Santa Luzia é minha versão pessoal das madeleines de Proust.
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