Paris é uma festaErnest Hemingway (Bertrand Brasil, 2006)
Ando apaixonada pela
Paris do início do século 20 e, se alguém me perguntasse, hoje, onde e em que época hipotética eu gostaria de ter vivido, diria que seria nessa Paris de Picasso e Matisse e Hemingway e Fitzgerald e
Gertrude Stein (embora não me falte a certeza de que eu pertenço mesmo ao aqui e ao agora, e que qualquer outra época idealizada - o Rio de Janeiro dos anos 50-60, a Nova York da Round Table, a São Paulo modernista - seria de um sofrimento enorme pra mim). Mas no começo do século 20 Paris era, sim, uma festa, e todo mundo conhecia todo mundo, e se encontrava nos cafés, e o dinheiro era curto mas dava até pra passar férias na Espanha, de vez em quando na Suíça.
É o que conta Ernest Hemingway, que chegou à cidade depois de ter sido motorista de ambulância na Primeira Guerra Mundial e que, em Paris, deu início à carreira de escritor enquanto era correspondente de um jornal canadense. Morava com mulher e filho num apartamentozinho na margem esquerda do Sena e alugava um quarto num hotel, ali perto, para poder trabalhar em paz. Logo que chegou, ficou conhecendo Gertrude Stein, com quem manteve uma relação intensa de amizade até que um fato velado, ou mal-explicado (pelo menos no livro), fez com que se afastassem - acho que teve a ver com a homossexualidade da escritora.
Assim, entre confissões das apostas feitas no jóquei (e que levaram um bom dinheiro para o ralo), o excelente relato de seu método de trabalho e os planos de viagem para Pamplona, Madri e Valência, Hemingway vai falando não só da vida, mas de amigos como Sylvia Beach, dona da livraria
Shakespeare and Company, Ford Madox Ford ("
I always held my breath when I was near him in a closed room"), Ezra Pound e, principalmente, F. Scott Fitzgerald, com quem Hemingway empreendeu uma viagem das mais bizarras.
Paris é uma festa foi organizado pela última mulher do escritor e publicado em 1964, depois de sua morte - Hemingway se matou com um tiro, em 1961. Ano passado, talvez um pouco antes, um de seus netos relançou o livro, dessa vez com mudanças na ordem dos capítulos e com o acréscimo de informações que, segundo ele, ajudariam a melhorar a imagem de sua avó, a segunda mulher do escritor, que aparece no fim do volume. Eu não vi nada de absurdo na maneira como o autor tratou do fim de seu casamento; achei até elegante. E, de qualquer modo, o livro que Hemingway imaginou me parece bem melhor do que qualquer variação que tenha vindo depois dele.